Fiquei estarrecida ao encontrar Soraia, uma amiga de minha última encarnação, em pleno vale dos perdidos. Logo ela que fora uma mulher distinta e dedicada à família. Onde, então, a justiça divina?!
-Porque o espanto, minha amiga? A qual justiça se refere: a dos homens ou a de Deus?
-É que conheci pessoalmente esta senhora e não consigo compreender as razões de vê-la em tão lamentável situação.
Messias, o guardião da noite, sorriu para sua interlocutora e lhe respondeu a contento.
-Estranho seria encontrá-la gozando de boas companhias em região aprazível, quando em vida cometera graves infrações contra as leis instituídas pelo Criador.
"Embora tenha sido boa mãe e esposa exemplar aos olhos do mundo, em seu íntimo, amargava uma vida de muita infelicidade em razão de negar seus verdadeiros sentimentos de mulher.
Transformou seu coração em lixeira emocional onde os irresponsáveis e levianos a procuravam somente para despejar suas frustrações cotidianas.
Fez de suas forças trampolim para o sucesso alheio. Porém esqueceu-se de usá-la em benefício próprio.
Muitas vezes, em nome do sacrifício ao próximo, não encontrava tempo nem para pentear os cabelos quanto mais para promover sua auto estima.
Soraia foi daquelas mulheres que só pensava nas necessidades dos outros. No entanto, para as suas próprias não dava a mínima importância.
Seria, então, injustiça por parte de Deus situá-la, após seu desencarne, em região como está onde aqueles que desprezaram a si mesmo se agrupam obedecendo a inviolável lei da afinidade?"
Minha indignação caiu por terra. Me dera conta, com as explicações do guardião da noite, da importância de se valorizar e de respeitar os próprios limites. Afinal, amar não é tornar-se capacho de ninguém e muito menos abandonar-se para socorrer as necessidades alheias. Entendi que minha amiga Soraia deixou-se vampirizar por causa de um falso amor. Vi, claramente, que o destino apenas acompanha nossos passos e que tudo está certo no Universo!
Carlinhos Lima
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